quarta-feira, 23 de outubro de 2013

O PROBLEMA DOS JULGAMENTOS “FATIADOS”

O PROBLEMA DOS JULGAMENTOS “FATIADOS”

Na 30ª Sessão Extraordinária de Julgamentos pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, realizada no dia 10/10/2013, causou-me espécie a determinação do Min. Ricardo Levandowisk, que presidia aquela Sessão, para que o Min. Luiz Fux, Relator da AP 432, fatiasse ou cingisse seu Voto em duas partes, proferindo apenas o juízo de culpabilidade e, se confirmada a condenação, passasse à fixação da pena.
Ou seja, após o Min. Relator votar pela condenação do acusado, antes que fosse fixada a pena, o Min. Presidente afirmou que o Pleno da Corte Constitucional havia assentado o entendimento de que todos os Ministros deveriam, primeiramente, votar acerca da culpabilidade ou não do acusado, para só após a afirmação do juízo de culpabilidade, votarem acerca fixação da pena.
Qual o problema disto? São pelo menos dois. O primeiro é que a fixação da pena integra o julgamento do próprio mérito da Ação Penal, pois é nesta fase que se mensura a culpabilidade, acaso esta seja afirmada. O segundo é que tal metodologia de julgamento “fatiado” pode alterar o verdadeiro resultado dos julgamentos.
No referido caso houve, sob nossa ótica, alteração do resultado do julgamento. O Min. Relator votou julgando totalmente procedente a pretensão acusatória, a Min. Revisora julgou-a parcialmente procedente, o Min. 1º vogal acompanhou o Min. Relator, o Min. 2º Vogal absolveu o acusado por atipicidade, o Min. 3º Vogal acompanhou a Min. Revisora, os Mins. 4º e 5º vogais acompanharam o Min. 2º vogal que votou pela atipicidade, e o Min. 6º vogal acompanhou a Min. Revisora. [somente 08 (oito) Ministros participaram do Julgamento]
Assim, foram 02 (dois) votos pela procedência total da acusação [sem que houvesse fixação da pena], 03 (três) votos pela procedência parcial [também sem que houvesse fixação da pena], e 03 (três) votos pela absolvição por atipicidade da conduta.
Segundo este critério fatiado de julgamento, a pretensão punitiva restou parcialmente acolhida e o acusado condenado, passando-se, assim, à fixação da pena. Então o Min. Relator e a Min. Revisora a fixaram pena em um patamar superior a 04 (quatro) anos, o que afastava a prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto, ao passo que os Mins. 1º, 3º e 6º vogais aplicaram a pena em 02 (dois) anos, o que implicou na prescrição da pretensão punitiva de modo retroativo, tendo-se como referência a pena em concreto. Assim, o resultado oficial do julgamento foi que o acusado teve a punibilidade extinta pela prescrição.
Eis o problema, se o julgamento não tivesse sido fatiado, o que nos parece absolutamente incorreto, o resultado teria sido outro. Ora, se o Voto fosse integral, tal como o Min. Relator pretendia votar, o resultado final teria sido 02 (dois) votos pela condenação com pena superior a 4 (quatro) anos, e 6 (seis) votos absolutórios, 03 (três) pela atipicidade, e 03 (três) pela prescrição retroativa que, por atingir a pretensão punitiva, possui no âmbito processual penal os mesmos efeito da absolvição.
Assim, o resultado final teria sido absolvição pela atipicidade, por ser este o entendimento mais favorável ao réu, conforme salientou o Ministro 2º vogal.
Ora, aplicar o critério do julgamento fatiado pode levar a resultados desastrosos. Pense-se no seguinte exemplo: Uma Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais julga um Prefeito Municipal de modo fatiado, ou seja, apenas decidindo acerca do juízo de culpabilidade, para em um segundo momento, se constatada a culpabilidade, fixar a pena. Na Sessão de Julgamento o Des. Relator vota pela absolvição por atipicidade, o Des. Revisor vota pela condenação, no que é seguido pelo Des. 1º vogal, o Des. 2º Vogal acompanha o Des. Relator, e o Des. 3º vota pela condenação.
Ter-se-ia 03 (três) votos pela condenação e 02 (dois) pela absolvição por atipicidade. No momento de fixar a pena, o Des. 3º vogal a fixa em um patamar que implique na prescrição da pretensão punitiva de modo retroativo, ao passo que o Des. Revisor e o Des. 1º vogal a fixam em um patamar elevado afastando a causa extintiva da punibilidade. Segundo os equivocados parâmetros do julgamento fatiado, o Prefeito restaria condenado, mesmo tendo havido ao todo 03 (três) votos favoráveis a ele, 02 (dois) reconhecendo a atipicidade e um (01) a prescrição da pretensão punitiva de modo retroativo.
Noutro giro, proferindo-se os votos de modo integral, teria sido o Prefeito Municipal absolvido pro 03 (três) votos a 02 (dois), e não condenado por 02 (dois) votos a 01 (um). Dentre os 03 (três) votos absolutórios, prevaleceria a tese da atipicidade, por ser a majoritária.
Ora, a prescrição da pretensão punitiva, ao contrário, por óbvio, da prescrição da pretensão executória, tem efeitos de absolvição penal, pouco importando se a mesma se dá pela pena abstrata ou pela pena em concreto, o relevante é que resta fulminada a pretensão punitiva.
Como a prescrição da pretensão punitiva equivale, para fins processuais penais, à absolvição, e a prescrição retroativa da pretensão punitiva só pode ser verificada após a fixação da pena concreta, é inaceitável que se fatie, que se cinja o julgamento, pois tal metodologia se revela capaz de alterar a verdadeira Decisão tomada pelo colegiado e modificar substancialmente a situação jurídica do acusado. 



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