segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Reforço de argumentação pelas instâncias ad quen - Inadmissibilidade - STF - HC 98862/MC

Prisão Cautelar - Gravidade do Delito - Reforço de Argumentação pelo Tribunal – Inadmissibilidade (Transcrições)

HC 98862 MC/SP*

RELATOR: MIN. CELSO DE MELLO

DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, com pedido de medida liminar, impetrado contra decisão, que, emanada do E. Superior Tribunal de Justiça, restou consubstanciada em acórdão assim ementado (fls. 121):

“‘HABEAS CORPUSLIBERATÓRIO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO - ART. 121, § 2º, I e III C/C O ART. 73, POR DUAS VEZES, DO CPB e 16, IV DA LEI 10.826/2003. PRISÃO EM FLAGRANTE EM 13/08/2007. CRIME HEDIONDO. LIBERDADE PROVISÓRIA. VEDAÇÃO LEGAL. ART. 2º DA LEI DOS CRIMES HEDIONDOS. FUNDAMENTAÇÃO SUFICIENTE. PRECEDENTES DO STJ E DO STF. ALEGAÇÃO DE INOCÊNCIA. INADEQUAÇÃO DOMANDAMUS’. PARECER DO MPF PELA DENEGAÇÃO. ORDEM DENEGADA.
1. A vedação de concessão de liberdade provisória, com ou sem fiança, na hipótese de crimes hediondos, encontra amparo no art. 5º XLIII da CF, que prevê a inafiançabilidade de tais infrações; assim, a mudança do art. 2º da Lei 8.072/90, operada pela Lei 11.464/2007, não viabiliza tal benesse, conforme entendimento sufragado pelo Pretório Excelso e por esta Corte, o que, por si só, constitui fundamento para a negativa do benefício (HC 89.068/RN, Rel. Min. CARLOS BRITTO, DJU 23.02.07, HC 93.940/SE, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI, DJU 06.06.08 e HC 92.414/SC, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJU 02.06.08).
2. A verificação da assertiva de inocência do acusado exige ampla dilação probatória, providência incompatível com o ‘mandamus’, que exige prova pré-constituída do direito alegado.
3. Parecer do MPF pela denegação da ordem.
4. Ordem denegada.”
(HC 112.910/SP, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO)

Passo a apreciar o pedido de medida liminar ora formulado pela parte impetrante. E, ao fazê-lo, entendo plausível, em sede de estrita delibação, a pretensão jurídica deduzida na presente causa.
Os fundamentos em que se apóia a presente impetração revestem-se de inquestionável relevo jurídico, especialmente se se examinar o conteúdo da decisão que manteve a prisão cautelar do ora paciente (prisão em flagrante), confrontando-se, para esse efeito, as razões que lhe deram suporte com os padrões que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou na matéria em análise.
Eis, no ponto, em seus aspectos essenciais, o teor da decisão, que, emanada do MM. Juiz de Direito da 3ª Vara do Tribunal do Júri da comarca de São Paulo/SP, motivou as sucessivas impetrações de “habeas corpusem favor do ora paciente (fls. 84):

“Mantenho a custódia do réu**, diante da gravidade do crime a ele imputado, classificado como hediondo.
Aguarde-se o interrogatório designado.”

Presente esse contexto, cabe verificar se os fundamentos subjacentes à decisão ora questionada ajustam-se, ou não, ao magistério jurisprudencial firmado pelo Supremo Tribunal Federal no exame do instituto da prisão cautelar.
A razão que fundamenta o decreto judicial que manteve  a prisão cautelar, cujo texto se acha reproduzido a fls. 84, resume-se à gravidade do crime.
Tenho para mim que a decisão em causa, ao manter a prisão em flagrante do ora paciente, indeferindo-lhe o pedido de concessão de liberdade provisória, apoiou-se em elementos insuficientes, destituídos de base empírica idônea, revelando-se, por isso mesmo, desprovida de necessária fundamentação substancial.
Todos sabemos que a privação cautelar da liberdade individual é sempre qualificada pela nota da excepcionalidade (HC 96.219-MC/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.), eis que a supressão meramente processual do “jus libertatisnão pode ocorrer em um contexto caracterizado por julgamentos sem defesa ou por condenações sem processo (HC 93.883/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO).
É por isso que esta Suprema Corte tem censurado decisões que fundamentam a privação cautelar da liberdade no reconhecimento de fatos que se subsumem à própria descrição abstrata dos elementos que compõem a estrutura jurídica do tipo penal:

“(...) PRISÃO PREVENTIVA - NÚCLEOS DA TIPOLOGIA - IMPROPRIEDADE. Os elementos próprios à tipologia bem como as circunstâncias da prática delituosa não são suficientes a respaldar a prisão preventiva, sob pena de, em última análise, antecipar-se o cumprimento de pena ainda não imposta (...).”
(HC 83.943/MG, Rel. Min. MARCO AURÉLIO – grifei)

Essa asserção permite compreender o rigor com que o Supremo Tribunal Federal tem examinado a utilização, por magistrados e Tribunais, do instituto da tutela cautelar penal, em ordem a impedir a subsistência dessa excepcional medida privativa da liberdade, quando inocorrente hipótese que possa justificá-la:

Não serve a prisão preventiva, nem a Constituição permitiria que para isso fosse utilizada, a punir sem processo, em atenção à gravidade do crime imputado, do qual (...) ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’ (CF, art. 5º, LVII).
O processo penal, enquanto corre, destina-se a   apurar uma responsabilidade penal; jamais a antecipar-lhe as conseqüências.
Por tudo isso, é incontornável a exigência de que a fundamentação da prisão processual seja adequada à demonstração da sua necessidade, enquanto medida cautelar, o que (...) não pode reduzir-se ao mero apelo à gravidade objetiva do fato (...).”
(RTJ 137/287, 295, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei)

Impende assinalar, por isso mesmo, que a gravidade em abstrato do crime não basta para justificar, só por si, a privação cautelar da liberdade individual do paciente.
O Supremo Tribunal Federal tem advertido que a natureza da infração penal não se revela circunstância apta, só por si, para justificar a privação cautelar do “status libertatis” daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado.
Esse entendimento vem sendo observado em sucessivos julgamentos proferidos no âmbito desta Corte, ainda que o delito imputado ao réu seja legalmente classificado como crime hediondo (RTJ 172/184, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RTJ 182/601-602, Rel. p/ o acórdão Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - RHC 71.954/PA, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, v.g.):

A gravidade do crime imputado, um dos malsinados ‘crimes hediondos’ (Lei 8.072/90), não basta à justificação da prisão preventiva, que tem natureza cautelar, no interesse do desenvolvimento e do resultado do processo, e só se legitima quando a tanto se mostrar necessária: não serve a prisão preventiva, nem a Constituição permitiria que para isso fosse utilizada, a punir sem processo, em atenção à gravidade do crime imputado, do qual, entretanto, ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’ (CF, art. 5º, LVII).”
(RTJ 137/287, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei)

A ACUSAÇÃO PENAL POR CRIME HEDIONDO NÃO JUSTIFICA A PRIVAÇÃO ARBITRÁRIA DA LIBERDADE DO RÉU.
- A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por atos arbitrários do Poder Público, mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, eis que, até que sobrevenha sentença condenatória irrecorrível (CF, art. 5º, LVII), não se revela possível presumir a culpabilidade do réu, qualquer que seja a natureza da infração penal que lhe tenha sido imputada.”
(RTJ 187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

Nem se diga que a decisão de primeira instância teria sido reforçada, em sua fundamentação, pelo julgamento emanado do E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (HC nº 1.146.968-3/5), no qual se denegou a ordem de “habeas corpusentão postulada em favor do ora paciente.
Cabe ter presente, neste ponto, na linha da orientação jurisprudencial que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria, que a legalidade da decisão que decreta a prisão cautelar ou que denega liberdade provisória deverá ser aferida em função dos fundamentos que lhe dão suporte, e não em face de eventual reforço advindo dos julgamentos emanados das instâncias judiciárias superiores (HC 90.313/PR, Rel. Min. CELSO DE MELLO, HC 96.715-MC/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, HC 97.976-MC/MG, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.):

“(...) Às instâncias subseqüentes não é dado suprir o decreto de prisão cautelar, de modo que não pode ser considerada a assertiva de que a fuga do paciente constitui fundamento bastante para enclausurá-lo preventivamente (...).”
(RTJ 194/947-948, Rel. p/ o acórdão Min. EROS GRAU - grifei)

A motivação, portanto, há de ser própria, inerente e contemporânea à decisão que decreta o ato excepcional de privação cautelar da liberdade, pois - insista-se - a ausência ou a deficiência de fundamentação não podem ser supridas “a posteriori” (RTJ 59/31 - RTJ 172/191-192 - RT 543/472 - RT 639/381, v.g.):

Prisão preventiva: análise dos critérios de idoneidade de sua motivação à luz de jurisprudência do Supremo Tribunal.
1. A fundamentação idônea é requisito de validade do decreto de prisão preventiva: no julgamento do hábeas corpus que o impugna não cabe às sucessivas instâncias, para denegar a ordem, suprir a sua deficiência originária, mediante achegas de novos motivos por ele não aventados: precedentes.”
(RTJ 179/1135-1136, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei)

Mesmo que se pudesse superar esse obstáculo, a alegação feita pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – fundada em juízo meramente conjectural (sem qualquer referência a situações concretas) – de que(...) é conveniente que lhe seja mantida a sua custódia provisória, para que ele não possa exercer qualquer influência na produção da prova em juízo, uma vez que as vítimas e as testemunhas residem no mesmo bairro (...)” (fls. 89), constitui, quando destituída de base empírica, presunção arbitrária que não pode legitimar a privação cautelar da liberdade individual, como assinalou, em recentíssimo julgamento, a colenda Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal:

“‘HABEAS CORPUS’ - PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA COM FUNDAMENTO NA GRAVIDADE OBJETIVA DOS DELITOS E NA SUPOSIÇÃO DE QUE OS RÉUS PODERIAM CONSTRANGER AS TESTEMUNHAS OU PROCEDER DE FORMA SEMELHANTE CONTRA OUTRAS VÍTIMAS - CARÁTER EXTRAORDINÁRIO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE INDIVIDUAL – UTILIZAÇÃO, PELO MAGISTRADO, NA DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, DE CRITÉRIOS INCOMPATÍVEIS COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL – SITUAÇÃO DE INJUSTO CONSTRANGIMENTO CONFIGURADA - PEDIDO DEFERIDO, COM EXTENSÃO DE SEUS EFEITOS AO CO-RÉU.

A PRISÃO CAUTELAR CONSTITUI MEDIDA DE NATUREZA EXCEPCIONAL.
- A privação cautelar da liberdade individual reveste-se de caráter excepcional, somente devendo ser decretada em situações de absoluta necessidade.
A prisão preventiva, para legitimar-se em face de nosso sistema jurídico, impõe - além da satisfação dos pressupostos a que se refere o art. 312 do CPP (prova da existência material do crime e presença de indícios suficientes de autoria) - que se evidenciem, com fundamento em base empírica idônea, razões justificadoras da imprescindibilidade dessa extraordinária medida cautelar de privação da liberdade do indiciado ou do réu.
- A questão da decretabilidade da prisão cautelar. Possibilidade excepcional, desde que satisfeitos os requisitos mencionados no art. 312 do CPP. Necessidade da verificação concreta, em cada caso, da imprescindibilidade da adoção dessa medida extraordinária. Precedentes.

A PRISÃO PREVENTIVA - ENQUANTO MEDIDA DE NATUREZA CAUTELAR - NÃO PODE SER UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE PUNIÇÃO ANTECIPADA DO INDICIADO OU DO RÉU.
- A prisão preventiva não pode - e não deve - ser utilizada, pelo Poder Público, como instrumento de punição antecipada daquele a quem se imputou a prática do delito, pois, no sistema jurídico brasileiro, fundado em bases democráticas, prevalece o princípio da liberdade, incompatível com punições sem processo e inconciliável com condenações sem defesa prévia.
A prisão preventiva - que não deve ser confundida com a prisão penal - não objetiva infligir punição àquele que sofre a sua decretação, mas destina-se, considerada a função cautelar que lhe é inerente, a atuar em benefício da atividade estatal desenvolvida no processo penal.

A GRAVIDADE EM ABSTRATO DO CRIME NÃO CONSTITUI FATOR DE LEGITIMAÇÃO DA PRIVAÇÃO CAUTELAR DA LIBERDADE.
- A natureza da infração penal não constitui, só por si, fundamento justificador da decretação da prisão cautelar daquele que sofre a persecução criminal instaurada pelo Estado. Precedentes.

A PRISÃO CAUTELAR NÃO PODE APOIAR-SE EM JUÍZOS MERAMENTE CONJECTURAIS.
- A mera suposição, fundada em simples conjecturas, não pode autorizar a decretação da prisão cautelar de qualquer pessoa.
- A decisão que ordena a privação cautelar da liberdade não se legitima quando desacompanhada de fatos concretos que lhe justifiquem a necessidade, não podendo apoiar-se, por isso mesmo, na avaliação puramente subjetiva do magistrado de que a pessoa investigada ou processada, se em liberdade, poderá delinqüir, ou interferir na instrução probatória, ou evadir-se do distrito da culpa, ou, então, prevalecer-se de sua particular condição social, funcional ou econômico-financeira.
- Presunções arbitrárias, construídas a partir de juízos meramente conjecturais, porque formuladas à margem do sistema jurídico, não podem prevalecer sobre o princípio da liberdade, cuja precedência constitucional lhe confere posição eminente no domínio do processo penal.

AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO, NO CASO, DA NECESSIDADE CONCRETA DE DECRETAR-SE A PRISÃO PREVENTIVA DO PACIENTE.
- Sem que se caracterize situação de real necessidade, não se legitima a privação cautelar da liberdade individual do indiciado ou do réu. Ausentes razões de necessidade, revela-se incabível, ante a sua excepcionalidade, a decretação ou a subsistência da prisão preventiva.

O POSTULADO CONSTITUCIONAL DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA IMPEDE QUE O ESTADO TRATE, COMO SE CULPADO FOSSE, AQUELE QUE AINDA NÃO SOFREU CONDENAÇÃO PENAL IRRECORRÍVEL.
- A prerrogativa jurídica da liberdade - que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) - não pode ser ofendida por interpretações doutrinárias ou jurisprudenciais, que, fundadas em preocupante discurso de conteúdo autoritário, culminam por consagrar, paradoxalmente, em detrimento de direitos e garantias fundamentais proclamados pela Constituição da República, a ideologia da lei e da ordem.
Mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, e até que sobrevenha sentença penal condenatória irrecorrível, não se revela possível - por efeito de insuperável vedação constitucional (CF, art. 5º, LVII) - presumir-lhe a culpabilidade.
Ninguém pode ser tratado como culpado, qualquer que seja a natureza do ilícito penal cuja prática lhe tenha sido atribuída, sem que exista, a esse respeito, decisão judicial condenatória transitada em julgado.
O princípio constitucional da presunção de inocência, em nosso sistema jurídico, consagra, além de outras relevantes conseqüências, uma regra de tratamento que impede o Poder Público de agir e de se comportar, em relação ao suspeito, ao indiciado, ao denunciado ou ao réu, como se estes já houvessem sido condenados, definitivamente, por sentença do Poder Judiciário. Precedentes.”
(HC 93.883/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO)

A mera suposição desacompanhada de indicação de fatos concretos - de que o ora paciente, em liberdade, poderia(...) exercer qualquer influência na produção da prova em juízo (...)” (fls. 89) - revela-se insuficiente para fundamentar o decreto de prisão cautelar (ou a decisão que a mantém, como no caso), se tal suposição, como ocorre na espécie dos autos, deixa de ser corroborada por base empírica idônea (que necessariamente deve ser referida na decisão judicial), tal como tem advertido, a propósito desse específico aspecto, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal (RTJ 170/612-613, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – RTJ 175/715, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE, v.g.).
Cumpre salientar, finalmente, que a superveniência da decisão de pronúncia – especialmente se esse ato decisório reafirma, como na espécie, a respeito das razões justificadoras da real necessidade de preservação da prisão cautelar do paciente, o mesmo fundamento inidôneo (fls. 96), – não faz instaurar situação de prejudicialidade da ação de “habeas corpus”, ainda mais se se mostrarem destituídos de idoneidade jurídica os fundamentos em que se apoiou a decisão que negou, em momento anterior, ao paciente, a concessão de liberdade provisória.
Impende ressaltar que esse entendimento tem o beneplácito do magistério jurisprudencial desta Suprema Corte:

1. Prisão por pronúncia de réu já anteriormente preso: pressuposto de validade da prisão cautelar anterior.
É sedimentada a jurisprudência no sentido de que, se a pronúncia, para conservar preso o réu, cinge-se à remissão aos fundamentos do decreto de prisão preventiva anterior, a eventual inidoneidade destes contamina de nulidade a prisão processual; ‘a fortiori’, a orientação é de seguir-se quando a pronúncia silencia totalmente a respeito, como ocorreu no caso. (...).”
(HC 83.782/PI, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE - grifei)

1. PRISÃO PREVENTIVA. Medida cautelar. Natureza instrumental. Sacrifício da liberdade individual. Excepcionalidade. Necessidade de se ater às hipóteses legais. Sentido do art. 312 do CPP. Medida extrema que implica sacrifício à liberdade individual, a prisão preventiva deve ordenar-se com redobrada cautela, à vista, sobretudo, da sua função meramente instrumental, enquanto tende a garantir a eficácia de eventual provimento definitivo de caráter condenatório, bem como perante a garantia constitucional da proibição de juízo precário de culpabilidade, devendo fundar-se em razões objetivas e concretas, capazes de corresponder às hipóteses legais (‘fattispecie abstratas’) que a autorizem.
2. AÇÃO PENAL. Prisão preventiva. Decreto fundado na gravidade do delito, a título de garantia da ordem pública. Inadmissibilidade. Razão que não autoriza a prisão cautelar. Constrangimento ilegal caracterizado. Precedentes. É ilegal o decreto de prisão preventiva que, a título de necessidade de garantir a ordem pública, se funda na gravidade do delito.
.......................................................
4. AÇÃO PENAL. Homicídio doloso. Júri. Prisão preventiva. Decreto destituído de fundamento legal. Pronúncia. Silêncio a respeito. Contaminação pela nulidade. Precedentes. Quando a sentença de pronúncia se reporta aos fundamentos do decreto de prisão preventiva, fica contaminada por eventual nulidade desse e, ‘a fortiori’, quando silencie a respeito, de modo que, neste caso, é nula, se o decreto da preventiva é destituído de fundamento legal. (...).”
(HC 87.041/PA, Rel. Min. CEZAR PELUSO - grifei)

Em suma: a análise dos fundamentos invocados pela parte ora impetrante leva-me a entender que a decisão judicial de primeira instância não observou os critérios que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou em tema de prisão cautelar.
Sendo assim, tendo presentes as razões expostas, defiro o pedido de medida liminar, para, até final julgamento desta ação de “habeas corpus”, suspender, cautelarmente, a eficácia da decisão que manteve a prisão em flagrante do ora paciente, referentemente ao Processo nº 052.07.002976-0 (3ª Vara do Tribunal do Júri da comarca de São Paulo/SP), expedindo-se, imediatamente, em favor desse mesmo paciente, se por al não estiver preso, o pertinente alvará de soltura.
Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão ao E. Superior Tribunal de Justiça (HC 112.910/SP), ao E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (HC 1.146.968-3/5) e ao MM. Juiz de Direito da 3ª Vara do Tribunal do Júri da comarca de São Paulo/SP (Processo nº 052.07.002976-0).
Publique-se.

Brasília, 06 de maio de 2009.

Ministro CELSO DE MELLO
Relator

* decisão publicada no DJE de 12.5.2009

** nome suprimido pelo Informativo

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