quarta-feira, 23 de outubro de 2013

Repercussão Geral - Prazo de duração das interceptação telefônica

Decisão sobre Repercussão Geral
13/06/2013 PLENÁRIO
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 625.263 PARANÁ
RELATOR :MIN. GILMAR MENDES
RECTE.(S) :MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
PROC.(A/S)(ES) :PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA
RECDO.(A/S) :ISIDORO ROZENBLUM TROSMAN E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S) :ANTÔNIO CARLOS DE ALMEIDA CASTRO E
OUTRO(A/S)
PROCESSO PENAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 5º; 93, INCISO IX; E 136, § 2º DA CF. ARTIGO 5º DA LEI N. 9.296/96. DISCUSSÃO SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DE SUCESSIVAS RENOVAÇÕES DA MEDIDA. ALEGAÇÃO DE COMPLEXIDADE DA INVESTIGAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. RELEVÂNCIA SOCIAL, ECONÔMICA E JURÍDICA DA MATÉRIA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada.
Manifestação sobre a Repercussão Geral
13/06/2013 PLENÁRIO
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 625.263 PARANÁ
MANIFESTAÇÃO PROCESSO PENAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 5º; 93, INCISO IX; E 136, § 2º DA CF. ARTIGO 5º DA LEI N. 9.296/96. DISCUSSÃO SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DE SUCESSIVAS RENOVAÇÕES DA MEDIDA. ALEGAÇÃO DE COMPLEXIDADE DA INVESTIGAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. RELEVÂNCIA SOCIAL, ECONÔMICA E JURÍDICA DA MATÉRIA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
Trata-se de recurso extraordinário que impugna acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no HC n. 76.686/PR, assim ementado:
Comunicações telefônicas. Sigilo. Relatividade. Inspirações ideológicas. Conflito. Lei ordinária. Interpretações. Razoabilidade. 1. É inviolável o sigilo das comunicações telefônicas; admite-se, porém, a interceptação nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer. 2. Foi por meio da Lei nº 9.296, de 1996, que o legislador regulamentou o texto constitucional; é explícito o texto infraconstitucional e bem explícito em dois pontos: primeiro, quanto ao prazo de quinze dias; segundo, quanto à renovação renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. 3. Inexistindo, na Lei nº 9.296/96, previsão de renovações sucessivas, não há como admiti-las. 4. Já que não absoluto o sigilo, a relatividade implica o conflito entre normas de diversas inspirações ideológicas; em caso que tal, o conflito (aparente) resolve-se, semelhantemente a outros, a favor da liberdade, da intimidade, da vida privada, etc. É que estritamente se interpretam as disposições que restringem a liberdade humana (Maximiliano). 5. Se não de trinta dias, embora seja exatamente esse, com efeito, o prazo de lei (Lei nº 9.296/96, art. 5º), que sejam, então, os sessenta dias do estado de defesa (Constituição, art. 136, § 2º), ou razoável prazo, desde que, é claro, na última hipótese, haja decisão exaustivamente fundamentada. Há, neste caso, se não explícita ou implícita violação do art. 5º da Lei nº 9.296/96, evidente violação do princípio da razoabilidade. 6. Ordem concedida a fim de se reputar ilícita a prova resultante de tantos e tantos e tantos dias de interceptação das comunicações telefônicas, devendo os autos retornar às mãos do Juiz originário para determinações de direito. (fls. 3.029)
Opostos embargos declaratórios, estes foram rejeitados, conforme ementa abaixo transcrita:
Comunicações telefônicas (interceptação). Embargos de declaração: prova (aproveitamento); decisão (efeitos/restrição); direito à segurança da sociedade (violação); questões constitucionais (contradição). 1. Já que se reputou ilícita a prova (resultante de tantos e tantos e tantos dias de interceptação), reputada o foi toda a prova (a resultante de tantos...). É a fruta ruim que arruína o cesto (HC-59.967, de 2006). Em tal aspecto, não foi, pois, obscuro o acórdão. 2. A restrição de efeitos tem mais a ver com a declaração de inconstitucionalidade, daí a dificuldade, e enorme, de se modularem temporalmente os efeitos de decisão tomada em casos como o presente. Em tal aspecto, não foi, pois, omisso o acórdão, já que princípios como o da prospecção, segurança jurídica e instrumentalidade não haveriam mesmo de vir à baila. 3. Se, entre o valor da segurança e o da liberdade, resolve-se o aparente conflito a favor da liberdade (entre outros, HCs 44.165, de 2006, e 95.838, de 2008), contraditório a tal propósito não foi o acórdão, porque não lhe foi indiferente o tema. 4. Está no acórdão: Nem menos nem mais fiz no curso deste voto do que escrever sobre lei ordinária, a saber, determinar o sentido e o alcance de normas infraconstitucionais. Então, se referência houve, ali e acolá, a princípios de ordem constitucional, tal se verificou de forma indireta, mediata e reflexa, e não de ordem direta, imediata e não reflexa. 5. Caso em que não padece o acórdão nem de obscuridade a ser aclarada, nem de contradição a ser corrigida, nem de omissão a ser suprida. 6. Embargos rejeitados. (fls. 23.104)
No apelo extremo, o Ministério Público Federal, ora recorrente, sustenta, em preliminar formal, a repercussão geral da matéria deduzida no recurso. No mérito alega, com base no artigo 102, inciso, III, alínea a, do permissivo constitucional, que o acórdão recorrido violou os artigos 5º; 93, inciso IX; e 136, § 2º, da Constituição Federal. Aduz que foi realizada uma ampla investigação, conhecida como Caso Sundown, perante o Juízo da Segunda Vara Criminal da Seção Judiciária Federal do Paraná, através de interceptações telefônicas que duraram cerca de 2 (dois) anos, pela prática de diversos crimes graves, dentre eles, delitos contra o Sistema Financeiro Nacional, corrupção, descaminho, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Irresignados, os investigados impetraram o presente habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça, postulando o reconhecimento da nulidade ab initio do Processo Penal em trâmite, em razão de suposta ilicitude na duração das interceptações telefônicas realizadas com prazo superior a 30 (trinta) dias, e de pretensa falta de fundamentação das decisões judiciais que as determinaram.
Diante disso, a Egrégia Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, reconheceu a ilicitude das interceptações telefônicas decorrentes das sucessivas renovações e concedeu a ordem a fim de se reputar ilícita a prova resultante de tantos e tantos e tantos dias de interceptação das comunicações telefônicas, devendo os autos retornar às mãos do Juiz originário para determinações de direito. (fl. 3.029)
Sustenta o recorrente, que a decisão concessiva da ordem afrontou o artigo 136, § 2º, da Constituição Federal, ao limitar a interceptação telefônica a determinado período, com base, essencialmente, no princípio da razoabilidade, assim como no princípio da vedação da proteção deficiente e no direito fundamental da sociedade e do Estado à segurança. Afirma-se, também, que o aresto combatido violou direta e imediatamente o princípio da fundamentação das decisões judiciais, previsto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, uma vez que as prorrogações foram devidamente justificadas nas instâncias ordinárias.
Aduz-se, ainda, que a decisão guerreada, além de ter sido alvo de diversas manchetes em jornais e sites do País, abriu espaço para a invalidação de centenas de operações policias efetuadas acerca da organização criminosa e dos delitos complexos por ela perpetrados em todo o território brasileiro, nas quais as interceptações duraram mais de 30 (trinta) dias.
Finalmente, pugna o Parquet pela desconstituição do acórdão recorrido e o reconhecimento da validade da interceptação telefônica realizada e o uso da prova dela decorrente.
Em contrarrazões, os recorridos sustentam a inexistência de repercussão geral da questão, bem como impossibilidade de reexame da matéria fático-probatória e ausência de ofensa direta aos dispositivos constitucionais suscitados (fls. 3.147-3.166).
O Tribunal a quo negou trânsito ao recurso extraordinário, ao argumento de que a alegação de violação constitucional suscitada pelo Parquet configura ofensa reflexa ao texto constitucional (fls. 3.168-3.169).
Contra referida decisão de inadmissibilidade foi interposto agravo de instrumento, que tramitou nesta Corte sob o n. AI 792.765, Rel. Min. Eros Grau, ao qual foi dado provimento para subida imediata do presente apelo extremo.
Instada a se manifestar, a Procuradoria-Geral da República, por seu Suprocurador-Geral da República Wagner Gonçalves, opinou pelo provimento do recurso.
É o relatório.
Observados os demais requisitos de admissibilidade do presente recurso, submeto a matéria à análise de repercussão geral.
A discussão jurídica presente no recurso ora apreciado diz respeito à constitucionalidade de sucessivas prorrogações do prazo de autorização para a interceptação telefônica, além do limite de 30 (trinta) dias estabelecido em sua lei de regência (artigo 5º, da Lei 9.296/96), ou do limite de 60 (sessenta) dias previsto no artigo 136, § 2º, da Constituição Federal.
A Constituição Federal protege o direito fundamental ao sigilo das comunicações telefônicas, estabelecendo no artigo 5º, inciso XII, que a restrição somente poderá efetivar-se por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
A jurisprudência desta Corte tem se manifestado sobre o assunto, admitindo, em algumas hipóteses, a possibilidade de renovação do prazo das interceptações telefônicas. Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes: Inq 2424, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 26.3.2010; HC 83.515/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Nélson Jobim, DJ 4.3.2005; e HC 106.129, Rel. Min. Dias Toffolli, DJe 26.3.2012.
Desse modo, verifico que, além de constitucional, a questão aqui apresentada transcende interesses meramente particulares e individuais das partes envolvidas no litígio, restando configurada a relevância social, econômica e jurídica da matéria, visto que a solução a ser definida por este Tribunal balizará não apenas este recurso específico, mas todos os processos em que se discute o tema.
Ante o exposto, demonstrado que a controvérsia transcende o interesse das partes envolvidas, manifesto-me pela existência da repercussão geral da matéria, nos termos do artigo 543-A, § 1º, do Código de Processo.
Brasília, 21 de maio de 2013.
Ministro GILMAR MENDES
Relator

REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 625.263 PARANÁ
PRONUNCIAMENTO
PRIVACIDADE – INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA – BALIZAMENTO NO TEMPO – ADMISSÃO NA ORIGEM – RECURSO EXTRAORDINÁRIO – REPERCUSSÃO GERAL CONFIGURADA.

1. O Gabinete prestou as seguintes informações:
Eis a síntese do que discutido no Recurso Extraordinário nº 625.263/PR, da relatoria do ministro Gilmar Mendes, inserido no sistema eletrônico da repercussão geral às 23 horas e 59 minutos do dia 24 de maio de 2013.
A Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do Habeas Corpus nº 76.686-PR, deferiu a ordem e declarou a nulidade dos atos processuais praticados na Ação Penal nº 2006.70.00.019980-5, determinando o retorno do processo ao Juízo de origem. Assentou a inviabilidade de renovações sucessivas da interceptação telefônica prevista na Lei nº 9.296/96, sob pena de violação ao princípio da razoabilidade. Observou não estar explícita, no artigo 5º do referido diploma legal, a possibilidade de ilimitadas prorrogações. Segundo asseverou, por configurar norma limitadora do direito à intimidade, deveria ser interpretada estritamente. No caso, as interceptações duraram mais de dois anos, prazo considerado desarrazoado pelo Tribunal Superior, pois excedente do período de trinta dias contido no mencionado dispositivo e de sessenta dias estabelecido no artigo 136, § 2º, da Carta da República.
Os embargos de declaração interpostos foram desprovidos.
No extraordinário protocolado com alegada base na alínea “a” do permissivo constitucional, o Ministério Público Federal argui afronta aos artigos 93, inciso IX, e 136, § 2º, do Texto de 1988. Articula com a ofensa ao princípio da vedação da proteção deficiente, porque o direito à segurança da sociedade e do Estado teria sido preterido para se tutelar bem jurídico individual, não se levando em conta o andamento de investigações relativas a centenas de crimes altamente complexos e lesivos à coletividade. Aduz mostrar-se pacífica a jurisprudência do Supremo no sentido da possibilidade de renovações sucessivas das interceptações telefônicas autorizadas judicialmente. Sustenta a licitude da prova obtida mediante a interceptação das conversas telefônicas, porquanto o Juízo de origem haveria fundamentado a prorrogação da medida.
Sob o ângulo da repercussão geral, afirma ultrapassar o tema o interesse subjetivo das partes, por versar assunto passível de impacto no panorama jurídico e social da coletividade. Consoante ressalta, o acórdão impugnado representa precedente para a invalidação de diversas operações policiais voltadas à investigação de delitos cometidos por grupos criminosos, nas quais as interceptações ultrapassaram trinta dias, o que ocasionaria um clima de insegurança jurídica.
Anota que a exigência de constar, nas decisões judiciais, fundamentação detalhada contraria a jurisprudência dominante do Supremo, além de demandar maior tempo na apreciação das controvérsias levadas ao Judiciário, contribuindo para a morosidade da Justiça.
Os recorridos, nas contrarrazões, discorrem acerca da inexistência de repercussão geral, da ofensa indireta aos dispositivos constitucionais aduzidos, bem como da impossibilidade de arguição de questão fática em sede de extraordinário. Em relação ao mérito, apontam a ausência de motivação adequada nos atos que implicaram a prorrogação das escutas telefônicas.
O extraordinário não foi admitido na origem. O recorrente interpôs agravo. Disse do cabimento do extraordinário e reiterou os argumentos veiculados no recurso. Os recorridos, na contraminuta, sustentam o acerto da decisão atacada.
O ministro Eros Grau, então relator, deu provimento ao agravo e determinou o processamento do extraordinário.
A Procuradoria Geral da República, em parecer, opina pelo provimento do recurso. Assevera a subsistência das premissas lançadas nas decisões das quais decorreram as
prorrogações determinadas pelo Juízo de origem, ante a complexidade da causa e a imprescindibilidade da medida para a investigação dos fatos. Conforme assinala, a interceptação telefônica deve durar o tempo necessário à completa investigação das condutas criminosas. Alude aos possíveis efeitos negativos que poderão surgir se prevalecer o entendimento adotado no acórdão recorrido, tais como anulação de condenações e vários procedimentos investigatórios em andamento.
Eis o pronunciamento do ministro Gilmar Mendes:
PROCESSO PENAL. INTERCEPTAÇÃO TELEFÔNICA. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO AOS ARTIGOS 5º; 93, INCISO IX; E 136, § 2º DA CF. ARTIGO 5º DA LEI N. 9.296/96. DISCUSSÃO SOBRE A CONSTITUCIONALIDADE DE SUCESSIVAS RENOVAÇÕES DA MEDIDA. ALEGAÇÃO DE COMPLEXIDADE DA INVESTIGAÇÃO. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. RELEVÂNCIA SOCIAL, ECONÔMICA E JURÍDICA DA MATÉRIA. REPERCUSSÃO GERAL RECONHECIDA.
Trata-se de recurso extraordinário que impugna acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no HC n. 76.686/PR, assim ementado:
Comunicações telefônicas. Sigilo. Relatividade. Inspirações ideológicas. Conflito. Lei ordinária. Interpretações. Razoabilidade. 1. É inviolável o sigilo das comunicações telefônicas; admite-se, porém, a interceptação nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer. 2. Foi por meio da Lei nº 9.296, de 1996, que o legislador regulamentou o texto constitucional; é explícito o texto infraconstitucional e bem explícito em dois pontos: primeiro, quanto ao prazo de quinze dias; segundo, quanto à renovação renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. 3. Inexistindo, na Lei nº 9.296/96, previsão de renovações sucessivas, não há como admiti-las. 4. Já que não absoluto o sigilo, a relatividade implica o conflito entre normas de diversas inspirações ideológicas; em caso que tal, o conflito (aparente) resolve-se, semelhantemente a outros, a favor da liberdade, da intimidade, da vida privada, etc. É que estritamente se interpretam as disposições que restringem a liberdade humana (Maximiliano). 5. Se não de trinta dias, embora seja exatamente esse, com efeito, o prazo de lei (Lei nº 9.296/96, art. 5º), que sejam, então, os sessenta dias do estado de defesa (Constituição, art. 136, § 2º), ou razoável prazo, desde que, é claro, na última hipótese, haja decisão exaustivamente fundamentada. Há, neste caso, se não explícita ou implícita violação do art. 5º da Lei nº 9.296/96,
evidente violação do princípio da razoabilidade. 6. Ordem concedida a fim de se reputar ilícita a prova resultante de tantos e tantos e tantos dias de interceptação das comunicações telefônicas, devendo os autos retornar às mãos do Juiz originário para
determinações de direito. (fls. 3.029) Opostos embargos declaratórios, estes foram rejeitados, conforme ementa abaixo transcrita: Comunicações telefônicas (interceptação). Embargos de declaração: prova (aproveitamento); decisão (efeitos/restrição); direito à segurança da sociedade (violação); questões constitucionais (contradição). 1. Já que se reputou ilícita a prova (resultante de tantos e tantos e tantos dias de interceptação), reputada o foi toda a prova (a resultante de tantos...). É a fruta ruim que arruína o cesto (HC-59.967, de 2006). Em tal aspecto, não foi, pois, obscuro o acórdão. 2. A restrição de efeitos tem mais a ver com a declaração de inconstitucionalidade, daí a dificuldade, e enorme, de se modularem temporalmente os efeitos de decisão tomada em casos como o presente. Em tal aspecto, não foi, pois, omisso o acórdão, já que princípios como o da prospecção, segurança jurídica e instrumentalidade não haveriam mesmo de vir à baila. 3. Se, entre o valor da segurança e o da liberdade, resolve-se o aparente conflito a favor da liberdade (entre outros, HCs 44.165, de 2006, e 95.838, de 2008), contraditório a tal propósito não foi o acórdão, porque não lhe foi indiferente o tema. 4. Está no acórdão: Nem menos nem mais fiz no curso deste voto do que escrever sobre lei ordinária, a saber, determinar o sentido e o alcance de normas infraconstitucionais. Então, se referência houve, ali e acolá, a princípios de ordem constitucional, tal se verificou de forma indireta, mediata e reflexa, e não de ordem direta, imediata e não reflexa. 5. Caso em que não padece o acórdão nem de obscuridade a ser aclarada, nem de contradição a ser corrigida, nem de omissão a ser suprida. 6. Embargos rejeitados. (fls. 3.104) No apelo extremo, o Ministério Público Federal, ora recorrente, sustenta, em preliminar formal, a repercussão geral da matéria deduzida no recurso. No mérito alega, com base no artigo 102, inciso, III, alínea a, do permissivo constitucional, que o acórdão recorrido violou os artigos 5º; 93, inciso IX; e 136, § 2º, da Constituição Federal.
Aduz que foi realizada uma ampla investigação, conhecida como Caso Sundown, perante o Juízo da Segunda Vara Criminal da Seção Judiciária Federal do Paraná, através de interceptações telefônicas que duraram cerca de 2 (dois) anos, pela prática de diversos crimes graves, dentre eles, delitos contra o Sistema Financeiro Nacional, corrupção, descaminho, formação de quadrilha e lavagem de dinheiro.
Irresignados, os investigados impetraram o presente habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça, postulando o reconhecimento da nulidade ab initio do Processo Penal em trâmite, em razão de suposta ilicitude na duração das interceptações telefônicas realizadas com prazo superior a 30 (trinta) dias, e de pretensa falta de fundamentação das decisões judiciais que as determinaram.
Diante disso, a Egrégia Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, à unanimidade de votos, reconheceu a ilicitude das interceptações telefônicas decorrentes das  sucessivas renovações e concedeu a ordem a fim de se reputar ilícita a prova resultante de tantos e tantos e tantos dias de interceptação das comunicações telefônicas, devendo os autos retornar às mãos do Juiz originário para determinações de direito. (fl. 3.029) Sustenta o recorrente, que a decisão concessiva da ordem afrontou o artigo 136, § 2º, da Constituição Federal, ao limitar a interceptação telefônica a determinado período, com base, essencialmente, no princípio da razoabilidade, assim como no princípio da vedação da proteção deficiente e no direito fundamental da sociedade e do Estado à segurança.
Afirma-se, também, que o aresto combatido violou direta e imediatamente o princípio da fundamentação das decisões judiciais, previsto no artigo 93, inciso IX, da Constituição Federal, uma vez que as prorrogações foram devidamente justificadas nas instâncias ordinárias.
Aduz-se, ainda, que a decisão guerreada, além de ter sido alvo de diversas manchetes em jornais e sites do País, abriu espaço para a invalidação de centenas de operações policias efetuadas acerca da organização criminosa e dos delitos complexos por ela perpetrados em todo o território brasileiro, nas quais as interceptações duraram mais de 30 (trinta) dias.
Finalmente, pugna o Parquet pela desconstituição do acórdão recorrido e o reconhecimento da validade da interceptação telefônica realizada e o uso da prova dela decorrente.
Em contrarrazões, os recorridos sustentam a inexistência de repercussão geral da questão, bem como impossibilidade de reexame da matéria fático-probatória e ausência de ofensa direta aos dispositivos constitucionais suscitados (fls. 3.147-3.166).
O Tribunal a quo negou trânsito ao recurso extraordinário, ao argumento de que a alegação de violação constitucional suscitada pelo Parquet configura ofensa reflexa ao texto constitucional (fls. 3.168-3.169).
Contra referida decisão de inadmissibilidade foi interposto agravo de instrumento, que tramitou nesta Corte sob o n. AI 792.765, Rel. Min. Eros Grau, ao qual foi dado provimento para subida imediata do presente apelo extremo.
Instada a se manifestar, a Procuradoria-Geral da República, por seu Suprocurador-Geral da República Wagner Gonçalves, opinou pelo provimento do recurso.
É o relatório.
Observados os demais requisitos de admissibilidade do presente recurso, submeto a matéria à análise de repercussão geral.
A discussão jurídica presente no recurso ora apreciado diz respeito à constitucionalidade de sucessivas prorrogações do prazo de autorização para a interceptação telefônica, além do limite de 30 (trinta) dias estabelecido em sua lei de regência (artigo 5º, da Lei 9.296/96), ou do limite de 60 (sessenta) dias previsto no artigo 136, § 2º, da Constituição Federal.
A Constituição Federal protege o direito fundamental ao sigilo das comunicações telefônicas, estabelecendo no artigo 5º, inciso XII, que a restrição somente poderá efetivar-se por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
A jurisprudência desta Corte tem se manifestado sobre o assunto, admitindo, em algumas hipóteses, a possibilidade de renovação do prazo das interceptações telefônicas. Nesse sentido, destaco os seguintes precedentes: Inq 2424, Tribunal Pleno, Rel. Min. Cezar Peluso, DJe 26.3.2010; HC 83.515/RS, Tribunal Pleno, Rel. Min. Nélson Jobim, DJ 4.3.2005; e HC 106.129, Rel. Min. Dias Toffolli, DJe 26.3.2012.
Desse modo, verifico que, além de constitucional, a questão aqui apresentada transcende interesses meramente particulares e individuais das partes envolvidas no litígio, restando configurada a relevância social, econômica e jurídica da matéria, visto que a solução a ser definida por este Tribunal balizará não apenas este recurso específico, mas todos os processos em que se discute o tema.
Ante o exposto, demonstrado que a controvérsia transcende o interesse das partes envolvidas, manifesto me pela existência da repercussão geral da matéria, nos termos do artigo 543-A, § 1º, do Código de Processo.
Brasília, 21 de maio de 2013.
Ministro GILMAR MENDES
Relator

2. O inciso XII do artigo 5º da Carta Federal admite o afastamento da regra consubstanciada na privacidade, remetendo a exceção, quando voltada a investigação criminal ou a instrução processual penal, aos termos da lei. Veio à balha, então, a de nº 9.296/96, a revelar que a interceptação telefônica será implementada por quinze dias, prazo prorrogável por idêntico período.
Eis, de início, o balizamento da exceção ao inciso XII do rol principal das garantias constantes do Diploma Maior. O tema está a merecer o enfrentamento do Supremo, não se podendo potencializar precedentes discrepantes das balizas constitucionais e legais. 

3. Manifesto-me pela existência de repercussão geral.

4. À Assessoria para acompanhar a tramitação do incidente, inclusive quanto a processos que, versando a mesma matéria, estejam no Gabinete. 

5. Publiquem.
Brasília – residência –, 7 de junho de 2013, às 12h30.
Ministro MARCO AURÉLIO

O PROBLEMA DOS JULGAMENTOS “FATIADOS”

O PROBLEMA DOS JULGAMENTOS “FATIADOS”

Na 30ª Sessão Extraordinária de Julgamentos pelo Pleno do Supremo Tribunal Federal, realizada no dia 10/10/2013, causou-me espécie a determinação do Min. Ricardo Levandowisk, que presidia aquela Sessão, para que o Min. Luiz Fux, Relator da AP 432, fatiasse ou cingisse seu Voto em duas partes, proferindo apenas o juízo de culpabilidade e, se confirmada a condenação, passasse à fixação da pena.
Ou seja, após o Min. Relator votar pela condenação do acusado, antes que fosse fixada a pena, o Min. Presidente afirmou que o Pleno da Corte Constitucional havia assentado o entendimento de que todos os Ministros deveriam, primeiramente, votar acerca da culpabilidade ou não do acusado, para só após a afirmação do juízo de culpabilidade, votarem acerca fixação da pena.
Qual o problema disto? São pelo menos dois. O primeiro é que a fixação da pena integra o julgamento do próprio mérito da Ação Penal, pois é nesta fase que se mensura a culpabilidade, acaso esta seja afirmada. O segundo é que tal metodologia de julgamento “fatiado” pode alterar o verdadeiro resultado dos julgamentos.
No referido caso houve, sob nossa ótica, alteração do resultado do julgamento. O Min. Relator votou julgando totalmente procedente a pretensão acusatória, a Min. Revisora julgou-a parcialmente procedente, o Min. 1º vogal acompanhou o Min. Relator, o Min. 2º Vogal absolveu o acusado por atipicidade, o Min. 3º Vogal acompanhou a Min. Revisora, os Mins. 4º e 5º vogais acompanharam o Min. 2º vogal que votou pela atipicidade, e o Min. 6º vogal acompanhou a Min. Revisora. [somente 08 (oito) Ministros participaram do Julgamento]
Assim, foram 02 (dois) votos pela procedência total da acusação [sem que houvesse fixação da pena], 03 (três) votos pela procedência parcial [também sem que houvesse fixação da pena], e 03 (três) votos pela absolvição por atipicidade da conduta.
Segundo este critério fatiado de julgamento, a pretensão punitiva restou parcialmente acolhida e o acusado condenado, passando-se, assim, à fixação da pena. Então o Min. Relator e a Min. Revisora a fixaram pena em um patamar superior a 04 (quatro) anos, o que afastava a prescrição da pretensão punitiva pela pena em concreto, ao passo que os Mins. 1º, 3º e 6º vogais aplicaram a pena em 02 (dois) anos, o que implicou na prescrição da pretensão punitiva de modo retroativo, tendo-se como referência a pena em concreto. Assim, o resultado oficial do julgamento foi que o acusado teve a punibilidade extinta pela prescrição.
Eis o problema, se o julgamento não tivesse sido fatiado, o que nos parece absolutamente incorreto, o resultado teria sido outro. Ora, se o Voto fosse integral, tal como o Min. Relator pretendia votar, o resultado final teria sido 02 (dois) votos pela condenação com pena superior a 4 (quatro) anos, e 6 (seis) votos absolutórios, 03 (três) pela atipicidade, e 03 (três) pela prescrição retroativa que, por atingir a pretensão punitiva, possui no âmbito processual penal os mesmos efeito da absolvição.
Assim, o resultado final teria sido absolvição pela atipicidade, por ser este o entendimento mais favorável ao réu, conforme salientou o Ministro 2º vogal.
Ora, aplicar o critério do julgamento fatiado pode levar a resultados desastrosos. Pense-se no seguinte exemplo: Uma Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de Minas Gerais julga um Prefeito Municipal de modo fatiado, ou seja, apenas decidindo acerca do juízo de culpabilidade, para em um segundo momento, se constatada a culpabilidade, fixar a pena. Na Sessão de Julgamento o Des. Relator vota pela absolvição por atipicidade, o Des. Revisor vota pela condenação, no que é seguido pelo Des. 1º vogal, o Des. 2º Vogal acompanha o Des. Relator, e o Des. 3º vota pela condenação.
Ter-se-ia 03 (três) votos pela condenação e 02 (dois) pela absolvição por atipicidade. No momento de fixar a pena, o Des. 3º vogal a fixa em um patamar que implique na prescrição da pretensão punitiva de modo retroativo, ao passo que o Des. Revisor e o Des. 1º vogal a fixam em um patamar elevado afastando a causa extintiva da punibilidade. Segundo os equivocados parâmetros do julgamento fatiado, o Prefeito restaria condenado, mesmo tendo havido ao todo 03 (três) votos favoráveis a ele, 02 (dois) reconhecendo a atipicidade e um (01) a prescrição da pretensão punitiva de modo retroativo.
Noutro giro, proferindo-se os votos de modo integral, teria sido o Prefeito Municipal absolvido pro 03 (três) votos a 02 (dois), e não condenado por 02 (dois) votos a 01 (um). Dentre os 03 (três) votos absolutórios, prevaleceria a tese da atipicidade, por ser a majoritária.
Ora, a prescrição da pretensão punitiva, ao contrário, por óbvio, da prescrição da pretensão executória, tem efeitos de absolvição penal, pouco importando se a mesma se dá pela pena abstrata ou pela pena em concreto, o relevante é que resta fulminada a pretensão punitiva.
Como a prescrição da pretensão punitiva equivale, para fins processuais penais, à absolvição, e a prescrição retroativa da pretensão punitiva só pode ser verificada após a fixação da pena concreta, é inaceitável que se fatie, que se cinja o julgamento, pois tal metodologia se revela capaz de alterar a verdadeira Decisão tomada pelo colegiado e modificar substancialmente a situação jurídica do acusado.